Thursday, January 18, 2007

Pegadas essenciais


Raiva silenciosa num ecoar de nada vago como essência de ti.
Observo o azul brilhante com reflexos de prata, em busca da razão de existires fora de mim e do todo que sou.
Quem sou? Não sei, cada vez menos encontro resposta a esta questão. Sou talvez o amor de ninguém, o amor de algum ser passado ou futuro, mas nunca neste tempo presente. Passei de anjo a demónio e fiquei-me pela mortalidade de uma existência sem razão, objectivo ou futuro. Passei a ser mais um na multidão, passei a ser mais um reflexo da verdadeira realidade que não é esta. Não sou, não existo e jamais existirei neste tempo em que o tempo não existe e para nada serve.
Vagueio por esta areia fina e mutável onde o mar apaga o rasto das minhas passagens. Não deixo rasto de mim neste mundo e caminho para o esquecimento existencial. Serei mais um que não existiu, mais um vazio a ocupar um espaço no cemitério. Serei mais espaço ocupado no arquivo dos registos.
Tento marcar mais um pouco as minhas pegadas, mas de nada serve, de nada mesmo. Não posso lutar contra a minha falta de existência, não posso lutar contra esta apatia medíocre que me funde com a sombra do tempo e que me anula o ser.
Carne, ossos e pele… em breve nem isso estará aqui para registar a minha passagem. Passagem que não sei a que se deve, nem para que serve… não sei para quê, nem porquê.
Podia fugir, mas não adianta, para onde for existirei e continuarei a não existir. Fugir de mim também não resolve… pois tudo o que faço parte de mim e abstrair-me de mim só resultaria por uns instantes não eternos. Sou obrigado a coabitar comigo, mesmo que não queira e mesmo que seja contra isso.
Queria apagar esta luz… queria mergulhar nesta escuridão de mim e não emergir a esta realidade que me sufoca e me mantêm cativo. Queria condensar-me no ar e voar livremente por entre as partículas gasosas que compõem a nossa atmosfera. Queria ser uma partícula de água e misturar-me com as outras milhares e deixar de me questionar.
Queria ser mais um grão de areia neste areal branco e puro, varrido pelo mar e pelo vento.
Queria ser invisível, não ter consciência, não pensar, nem reclamar. Queria não ser mais do que aquilo que já não sou.
Leva-me contigo
Tira-me daqui
Liberta-me ao vento
Que eu vou.

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